Muito se questiona acerca da possibilidade - ou não - de interceptação de conversas de WattsApp e outros aplicativos de mensagens no âmbito da investigação criminal ou no processo penal.
As empresas multinacionais dizem que NÃO, não ser possível a interceptação em virtude da tecnologia da criptografia de ponta a ponta, que cria um código de embaralhamento das informações em que apenas o remetente e o destinatário têm acesso ao conteúdo das mensagens.
Na jurisprudência, encontramos decisões em que tribunais pátrios determinaram a retirada da criptografia para fins de monitoramento dos investigados, tendo aplicado milhões de reais em multas pelo descumprimento das determinações judiciais.
"Sendo o WhatsApp aplicativo de mensagens que utiliza o tráfego de dados de internet para a comunicação entre os usuários de linhas telefônicas, submete-se à Lei no 12.965/2014, estando, assim, obrigado a cumprir a decisão que determinou a interceptação do fluxo de dados das contas vinculadas aos investigados relacionados existentes no aplicativo WhatsApp.
A opção de ter serviços criptografados é de mera opção comercial, não afastando o dever de atendimento a obrigações legais e decisões judiciais, sob pena de se colocar em jogo não apenas a soberania nacional, mas, principalmente, colocar-se uma coletividade de consumidores sob riscos e sem proteção do sistema jurídico nacional. Isto é, a criptografia não pode ser tratada como absoluta, a ponto de recusar aplicabilidade à legislação brasileira."
(TRF4; MS 50026052-03.2017)
No entanto, a jurisprudência dos tribunais superiores tem se orientado no sentido da impossibilidade técnica de interceptação das conversas em tempo, tendo afastado a incidência de multas nestes casos.
A razão de ser deste entendimento é que “a aplicação da multa não deve ser admitida, pois a realização do impossível, sob pena de sanção, não encontra guarida na ordem jurídica.”
Ademais, a de se acrescentar que no STF os julgamentos das ADPF 403 e ADI 5527 caminham para o entendimento de que a ciência corrobora a impossibilidade técnica de interceptar dados criptografados de ponta a ponta.
Na Suprema Corte, os relatores desses dois processos, o ministro Edson Fachin e a ministra Rosa Weber, chegaram à mesma conclusão, de que o ordenamento jurídico brasileiro não autoriza que, em detrimento dos benefícios trazidos pela criptografia para a liberdade de expressão e o direito à intimidade, as empresas de tecnologia sejam multadas por descumprimento de ordem judicial incompatível com a encriptação.
Pois bem, diante deste cenário tem-se que os órgãos de investigação podem ter acesso as conversas de WattsApp dos usuários apenas em duas possibilidades:
1) quando o celular é apreendido (e conversas constantes do aplicativo ou da memória interna são resgatadas), e/ou;
2) quando o usuário não desabilita a função de backup do aplicativo e salva as conversas na nuvem, pois “empresas que prestam serviços de aplicação na internet em território brasileiro devem necessariamente se submeter ao ordenamento jurídico pátrio, independentemente da circunstância de possuírem filiais no Brasil e/ou realizarem armazenamento em nuvem” (STJ; RMS 66.392/RS, julg. em 16/08/22).
No inteiro teor do RMS 66.392, tem-se que "o art. 11 da Lei n. 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) é claro na determinação de aplicação da legislação brasileira a operações de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de dados por provedores de aplicações, exigindo apenas que um desses atos ocorra em território nacional.
Acrescenta-se, ainda, que o armazenamento em nuvem, estrategicamente utilizado por diversas empresas nacionais e estrangeiras, possibilita que armazenem dados em todos os cantos do globo, sem que essa faculdade ou estratégia empresarial possa interferir na obrigação de entregá-los às autoridades judiciais brasileiras quando envolvam a prática de crime em território nacional."
Inúmeros são os casos criminais baseados em conversas de WattsApp arquivadas na nuvem.
Desta feita, respondendo a pergunta proposta: tem-se que conversas do WattsApp não podem ser interceptadas em tempo real, salvo se no aparelho do usuário estiver ativada a função de backup das conversas no aplicativo, então, pela interceptação telemática, a polícia poderá ter acesso as conversas transferidas para nuvem.
José Corsino Peixoto Neto
Advogado Criminalista - OAB/PB 12.963